segunda-feira, 5 de abril de 2010

Prato de família


Sábado fiz uma paella de Aleluia em casa usando a panela da minha tataravó Enedina. Mas esqueci, na hora de deixar a paella descansar, do poder de cocção das panelas de ferro. Só isso. Desliguei o fogo com o arroz no ponto bom e com ainda bastante líquido, como deve ser, mas a panela seguiu cozinhando por mais um tempão. E o arroz deu uma passadinha – na panela de ferro desligar com bastante água e arroz bem al dente, fica aí a dica.

A desgraça só não foi completa porque eu estava usando o arroz senia – arroz espanhol ideal para fazer o prato, ao lado do bomba, e que aguenta bas
tante água sem empapar, tipo carnaroli e arbóreo, mas que não solta tanto amido como esses dois. A maioria das pessoas acaba usando ou arroz italiano ou parboilizado pra fazer paella – eu mesma já usei – mas acho o resultado infinitamente melhor com o senia ou o bomba.

Além do grão absorver bastante o caldo, ele agüenta algumas mexidinhas, permitindo que você refogue e cozinhe o arroz previamente no caldo, para somente depois adicionar as carnes, legumes e por fim os frutos do mar. Assim, o arroz fica no ponto, com bastante gosto, e o camarão, lagostins, lulas e o que mais você adicionar, não vão ficar passados ou borrachudos.

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O único lugar que eu encontro arroz bomba e/ou senia com regularidade é o Empório Santa Maria. Além de ideal, o arroz vem em saquinhos lindos de pano. O preço é de cerca de R$ 23 por 1kg.


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Outras dicas lá de casa:

Não abro mão de fazer como a vertente catalã da família, que usa alcachofra (e o caldo dela, junto com o de frutos do mar) no preparo. Minha avó, que é de Santander, se mudou para Barcelona (onde nasceu minha mãe) na época da Guerra Civil e adotou o ingrediente, usado até hoje por todas nós. Em períodos fora de época como agora, só se encontra a peso de ouro, mais caro que o próprio açafrão, mas tudo bem (na banca do Minhoca na feira de Sábado da Mourato Coelho sempre tem, pois o cara diz que tem uma cliente viciada que vai toda semana lá só pra levar uma caixa).

Pra quem está com preguiça de limpar o camarão, a dica na mesma feira é comprar na barraca da Rosa, que limpa MESMO, inclusive tirando a tripinha, coisa que os caras do CEAGESP não fazem nem se você implorar (aliás, com a fila que tem para esperar a limpeza do peixe, dá até pra entender). Peça as cabeças que eles vão jogar fora, junte um pouco de vôngole e faça um caldo incrível para cozinhar o seu arroz.

Não encane com aquela queimadinha no fundo da panela, ele até ajuda a dar um gosto defumado na paella. O Bruno, que morou um tempão em Barcelona e que esteve Sábado em casa, disse que nas competições do prato, quem não tem “queimadinho no fundo” é desclassificado. Mas quem tem queimadinho demais também perde pontos (às vezes acontece).

Para quem tem aquelas churrasqueiras redondas portáteis americanas, vale super usar em dias sem chuva para fazer o prato – não foi o caso de Sábado. Além do preparo ser rápido e por igual (você não tem que ficar mudando a panela de lugar toda hora como no fogão), ainda dá pra tapar no final e dar aquela defumadinha. Acho melhor que o tripé-fogareiro, mas é preciso ter as manhas para não deixar o fogo muito alto.


Eu amo paella bem untuosa. Por isso, a marinera, só com frutos do mar pra mim não serve. Quem tem sangue espanhol sabe: paella cada família tem a sua receita, que por sua vez é adaptada por cada elemento, a seu gosto. Por isso, espanhol que se preza acha que a sua é a melhor paella que existe! Minha avó gosta de por coelho, mas eu e minha mãe gostamos mesmo é de colocar costelinha de porco, previamente dourada na própria panela. Eu também separo um pouquinho da gordura dela e uso pra refogar o arroz. É, na banha mesmo. Do porco.


Aleluia!


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Foto da paella roubada daqui (estávamos tão famintos que não deu tempo de tirar foto alguma)

Um comentário:

Unknown disse...

Marina, perfeito seu post. Sou filho de espanhol e, desde pequeno, como paella. A lá de casa é a completa, que as vezes choca um pouco as pessoas que não conhecem, por misturar porco, frango, lula, camarão, polvo. É sem dúvida, "a melhor paella que pode existir"...rs... Aqui no Rio não é muito fácil encontrar o arroz Sênia. p.s.: Minha irmã e minha prima se chamam Marina e Fuentes era o sobrenome da minha avó, que se perdeu no Arcos Perez que foi pro meu pai...